Um espaço dedicado a um dos poetas que mais amo. Mato-grossense faz lirismo com tudo que é simples. Na poesia dele tudo é permitido, até inventar palavras. Quanta liberdade Manoel nos dá!

Nos poemas do escritor, gafanhotos e caracóis são os personagens principais. A “desutilidade” e “dessaber” são temas recorrentes.

Obrigada por tanto Manoel de Barros. Suas poesias me abraçaram e continuam me fazendo afago em muitos momentos. Espero que ajudem a vocês também! Como Manoel diz: “Eu pendurei um bem-te-vi no sol…”

ou

“Quando as aves falam com as pedras

e as rãs com as águas é de poesia que estão falando”

Manoel de Barros

“Quando eu nasci

o silêncio foi aumentado.

Meu pai sempre entendeu

Que eu era torto

Mas sempre me aprumou.

Passei anos me procurando por lugares nenhuns.

Até que não me achei- e fui salvo.

Às vezes caminhava como se fosse um bulbo.”

O ANDARILHO

“Eu já disse quem sou ele.
Meu desnome é Andaleço.
Andando devagar eu atraso o final do dia.
Caminho por beiras de rios conchosos.
Para as crianças da estrada eu sou o Homem do Saco.
Carrego latas furadas, pregos, papéis usados.
(Ouço harpejos de mim nas latas tortas.)
Não tenho pretensões de conquistar a inglória perfeita.
Os loucos me interpretam.
A minha direção é a pessoa do vento.
Meus rumos não têm termômetro.
De tarde arborizo pássaros.
De noite os sapos me pulam.
Não tenho carne de água.
Eu pertenço de andar atoamente.
Não tive estudamento de tomos.
Só conheço as ciências que analfabetam.
Todas as coisas têm ser?
Sou um sujeito remoto.
Aromas de jacintos me infinitam.
E estes ermos me somam.”

o APANHADOR DE DESPERDIÇIOS

Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas.
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim esse atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor meus silêncios.

Manoel de Barros, Memórias inventadas – A infância

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